A terra é apenas um local de passagem. Grande é a nossa dificuldade em entender e aceitar isso, pois as provas foram ocultas por força de uma lei espiritual, a do esquecimento. Ocultas sim, adormecidas jamais. Diferentemente dos irmãos ursos, estas não hibernam, pelo contrário, nos provocam com seu jeito sutil de ser e de se fazer presente bem lá no cerne da nossa alma.
Silenciosas, amontoam-se umas sobre as outras, resultado daquele jeitinho nosso de ir empurrando as coisas com algo que não nos falta, ao menos nestes rincões onde carne gorda é mais que um mandamento sagrado. Se deixar, eu entro em outro assunto e acabo me perdendo. Fica assim, o dito pelo não dito.
Não é sobre tradições, churrascos ou barrigas que eu quero escrever. Penso sobre estas oportunidades que temos para estar em contato com qualquer coisa que acrescente, de preferência uma leitura instigante, daquelas que nos remete a um repensar mais forçado. Mas pode ser também as tirinhas de um jornal, ou um livro de autoajuda comprado ali na banca. Tudo vale nesta terra e sobre ela também, desde que nos façam bem, que mal tem? Resposta: nenhum.
O que não pode acontecer, mas que infelizmente vem se repetindo, e muito, é este estado de doença que toma conta das pessoas, fazendo com que umas arrastem as outras por diante, sem saber ao certo para onde estão sendo levadas. E o mais estranho nesta novela mexicana é o “sentimento de solidariedade” que umas têm para com as outras, pois desde que estejam todas no mesmo barco, não faz mal que este afunde, pois assustador seria morrer só na imensidão do caos que cada uma carrega consigo.
Nada ficará em nós, nada levaremos nas bolsas ou na carteira. Tudo ficará e será consumido pelo tempo, pelo esquecimento, pelas traças ou pelos herdeiros daquilo que um dia nos pertenceu. Que palavra forte esta, “pertencer”... viu só como é que funciona o tal do ego? “eu, meu, minha”. Como posso evoluir (mesmo que eu não saiba disso) calcado nestes sentimentos de posse por algo ou por alguém? Estar aqui hoje, encarnado, fazendo uso de um corpo físico qualquer, seja da cor que for, falando o idioma que for, vestindo roupas iradas ou cobrindo o corpo com trapos velhos e sujos ou folhas de jornais, tanto faz. O que eu preciso realmente fazer é pensar na minha vida, não nos meus problemas. Tentar encontrar aquilo que ainda não fiz a favor do espírito que habita o “meu” corpo, o meu eu, a minha verdadeira essência.
Ter nascido aqui não torna este local um ponto de origem, mas sim um ponto de passagem. Um dia nós chegamos, depois nos vamos... como diz a letra de uma música que eu gosto muito e que considero uma bela fonte de inspiração, pois é daquelas canções que tocam no player da alma. Lembro que quando escrevia a primeira coluna, esta canção companheira estava lá, presente... Tocando ao fundo, e em frente.
Coisas simples compõem estas melodias da vida. Olhe para o lado, elas insistem em ficar na sua volta, querendo apenas um pouco da sua atenção. Afinal, o que você está esperando? Como diria um cobrador de ônibus: “tudo isso é passageiro”. Eu completaria: “pois nada é para sempre”. Pense nisso.
Ainda tem muita gente presa a um sistema de vida que não contempla abertura de consciência para uma vivência mais feliz. Corações sufocados, olhos caídos, bocas caladas, mãos fechadas, braços recolhidos, corpos cansados, almas doentes.
Letras químicas ditam o ritmo da sinfonia da nossa alma triste. Até quando? A próxima partida poderá não estar muito longe. Tentemos, então fazer desta parada um local de revisão, de reflexão, de diálogo interior.