Tente acompanhar este texto com um mínimo de atenção, deixando um pouco a velha agitação de lado. Não é necessário que você se livre dela. Apenas mude o foco por breves instantes. Peço isso não pela complexidade do tema, mas sim por causa de sua simplicidade. Nossas vidas tornaram-se vidas tão emaranhadas que já não há mais lugar para o simples. Somos complexos porque nos tornamos “inteligentes” demais, e ao escolher isso não percebemos que nem tudo encontrará resposta no enclausurado vazio da nossa intrincada mente sapiens. Criamos dispositivos para a obtenção de todas as respostas que gostaríamos de ter. Mas que bom que a ciência existe, porém algo não deu certo. Criamos as ferramentas sem preparar os operadores. Falta mão-de-obra especializada. Não é assim, não somos máquinas.
Nossas frágeis vidas de diárias e intermináveis experiências são como trens aos quais novas e estranhas bagagens irão sendo acrescentadas em cada nova estação. Passageiros desembarcarão e certamente deixarão algumas marcas. Saudade, tristeza, dor, angústia, melancolia, indiferença, ódio, soberba, prepotência, avareza, egoísmo, altruísmo, alegria, bondade, paz, humanidade, tranqüilidade, caridade, felicidade, palavra, perdão, fé, gratidão... As paradas de desembarque também servirão para embarque. E nesta marcha seguiremos em frente.
O apito do trem nos avisa que uma nova parada está para acontecer. Sem perceber o alerta, nossos olhares perdidos seguem distraídos com imagens vistas através das janelas. Estamos adormecidos para muitas coisas que acontecem dentro e fora do trem. Escutamos apenas coisas que nos agradam e olhamos somente para coisas que nos enchem os olhos. A surdez e a cegueira do espírito travam nossos caminhos, barram nossa evolução.
E então, faremos o que durante toda a viagem? Palavras cruzadas? Sem perceber que “cruzadas” são as vidas que embarcam e desembarcam neste trem que é a nossa oportunidade de fazer melhor.
Ao andar por cada vagão, encontraremos novas e velhas marcas. Muitas delas deixadas lá por nós mesmos. E agora, perdidas na trama do tempo e hoje redescobertas, revestem-se de alvoroço numa indecifrável dança, trazendo à lembrança músicas de um outro tempo e fazendo-nos perceber que sempre estiveram lá.
Pensando nestas e em outras tantas questões, eu me vejo tão pequeno diante das coisas que escolhi e aceitei para esta minha encarnação que por vezes chega a dar um certo temor. Há tanta coisa a fazer... Será que vou dar conta do recado? Exatamente para onde estou me conduzindo?
Um grande abraço e uma boa viagem.